domingo, 27 de dezembro de 2015

RETROSPECTIVA 2015

Breves análises de um ano emblemático

Quinze anos adentro neste novo milênio e é possível sentir o cenário do surf se transformando. Para o surf competitivo profissional brasileiro 2015 foi o ápice, culminando com o título de Adriano de Souza na primeira temporada da WSL, a “nova” Liga Mundial de Surf.

ADRIANO MINEIRINHO E SUA CHEGADA TRIUNFAL À SUA TERRA NATAL, O GUARUJÁ
IMAGEM RETIRADA DO INSTAGRAM DE ADRIANO DE SOUZA

Nesta postagem irei destacar alguns fatos que me chamaram a atenção e como sempre tendo uma perspectiva histórica. Desde 1967, quando tomei contato com o surf e desde 1986, quando comecei a trabalhar profissionalmente na imprensa, não há como não colocar o ano de 2015 como a temporada em que o orgulho de ser surfista brasileiro ganhou suas maiores proporções. Mas sempre existem os dois lados da moeda.

CAPA DA REVISTA ISTO É QUE FECHA O ANO DE 2015
O DESTAQUE POSITIVO É O SURF

As principais revistas semanais brasileiras a Veja, Época e Isto É deram espaço significativo para as façanhas dos surfistas brasileiros na Liga. Esta foi a notícia (esportiva) mais feliz deste final de mais um ano conturbado no Brasil e no Mundo.

PÁGINA DUPLA DA ISTO É Nº 2404, DE 6 DE JANEIRO DE 2016
GABRIEL MEDINA, FILIPE TOLEDO E ADRIANO DE SOUZA
ESTRELAS DE NOSSA MELHOR TEMPORADA NO CIRCUITO MUNDIAL

Nem tudo foram “rosas” para o surf brasileiro, nos últimos meses do ano enfrentamos o mais grave desastre ecológico da história do Brasil, afetando o ecossistema do leito do Rio Doce, um dos mais importantes do país e por tabela, depois de dias... o vilarejo de Regência, na desembocadura do rio. Uma quantidade absurda de lama, impregnada de dejetos de mineração, desceu mais de 800 Kms, Brasil adentro e afora, desembocando no mar ao norte do litoral capixaba. Muitos consideram as ondas de Regência as melhores do Estado do Espírito Santo, os estragos ao ecossistema local devem perdurar por muitos anos.

REPRODUÇÃO DA ABERTURA DE MATÉRIA PUBLICADA NA REVISTA SURFAR 2012
FOTO DE CELSO PEREIRA JUNIOR

FOTO DO FINAL DO ANO DE 2015
A VILA DE REGÊNCIA NO CANTO ESQUERDO

O resultado final desta hecatombe ambiental só poderá ser aquilatado daqui a alguns anos, mas temos que seguir em frente e continuar batalhando para defender nossos recursos naturais. No livro que estou preparando “A GRANDE HISTÓRIA DO SURF BRASILEIRO” as questões ambientais e as organizações que lutam para manter os oceanos e praias um lugar imaculado e agradável terão menção e destaque.
Na capa e no índice da mesma Isto É citada acima, os destaques (a não ser com relação ao surf) são para situações calamitosas deste ano que se vai. Uma presidente que faz vista grossa para os verdadeiros problemas da nação; um congresso perdido em interesses que não tem nada a ver com a ordem e o progresso do país; um povo que se mobiliza em manifestações, mas que não tem força, não usa o seu voto, para mudar de fato o país (por enquanto); um cachorro sendo salvo deste mar de lama que nos metemos; e Adriano de Souza, deslizando em um tubo azul do Tahiti.


ÍNDICE (PARCIAL) DA ÚLTIMA ISTO É DE 2015
QUE AINDA TRAZ A TRISTE NOTÍCIA DO INCÊNDIO DA ESTAÇÃO DA LUZ
E DO MUSEU DA LÍNGUA PORTUGUESA EM SÃO PAULO

Chega de desgraça, aqui neste blog e no livro que estou produzindo, o objetivo maior é trazer à luz, registrar, documentar, o que aconteceu de importante e positivo nesta grande e longa história do surf brasileiro.
Vamos falar então de um ano maravilhoso para o esporte no país.
Tenho sido bastante factual neste blog (Histórias do Surf), mas agora vou abordar os acontecimentos deste último Billabong Pipeline Masters e do contexto do ano 2015, de forma analítica, como eu sempre gostei de fazer quando escrevia minhas coberturas de competições, primeiro na Fluir, depois na Hardcore e também em minhas colunas no site Surf Reporter e depois na Alma Surf.
Um brinde a nossos TRIs.
Adriano de Souza, campeão da Tríplice Coroa Australiana (que ainda não foi inventada); Filipe Toledo, único tricampeão de eventos da WSL em 2015; e Gabriel Medina, campeão da Hawaiian Triple Crown.

ADRIANO DE SOUZA DESPENCANDO EM THE BOX - MARGARET RIVER
 MINEIRO EM IMAGEM RECORTADA DO SITE SURFERTODAY

GABRIEL MEDINA NO PIPE MASTERS DE 2015
DUAS FINAIS SEGUIDAS EM PIPELINE
O TÍTULO VIRÁ, TODOS NÓS SABEMOS DISSO

 FILIPE TOLEDO 3 VITÓRIAS EM 2015, AS PRIMEIRAS
GOLD COAST, BARRA DA TIJUCA E SUPERTUBOS EM PORTUGAL
MONTAGEM COM FOTOS: WSL

Vamos abrir espaço para alguns comentários sobre esta performance brasileira na temporada 2015 e vamos de trás para frente, destacando o Billabong Pipeline Masters. De trás para frente nos leva à cerimônia de premiação e as entrevistas. Um grande sinal da maturidade é a qualidade das entrevistas que tanto Adriano, como Gabriel deram (em inglês). Os dois estavam no centro das atenções, no pódio, depois com diversos microfones apontados e mandaram muito bem. Este é um aspecto muito importante para o reconhecimento do surf brasileiro internacionalmente. O surf é um esporte de língua inglesa, o “circo” de apresentação é montado dessa forma e é importante termos esta ciência e desenvoltura não só nas ondas como também fora da água. Há muito a evoluir aqui (como nos casos de Ítalo e outros rookies), mas o caminho está certo.

DENTRO DA ÁGUA
Os dias 16 e 17 de dezembro de 2015 foram recheados de expectativa. Tudo podia acontecer, não havia como montar um script, dada a diversidade de alternativas. No dia 16 quebrou Pipeline de verdade, as famosas ondas ocas desafiadoras de 3 a 4 metros de face, algumas abrindo, outras fechando. Mar para MASTERS e os cinco candidatos ao título estavam lá.
Para o dia 17 restaram três e embora as ondas estivessem longe da fama (e qualidade) de Pipeline, era um mar altamente competitivo. Não há o que questionar. Acompanhando as coberturas da internet e da ESPN Brasil, conversando com amigos, muitas dúvidas podem pairar. A nota 2 e pouco de Filipinho que não saiu? O que poderia ter acontecido se o mar estivesse maior no dia decisivo? E por aí vai.
Na verdade Kieren Perrow deixou passar uma mar lindo, de dois metros e meio, prá lá de perfeito, com sol e pouco vento, muito melhor que o dia das finais. Mar de sonho mesmo. Isso foi uns dois dias antes do dia clássico (16 de dezembro), mas também não dá para crucifica-lo, pois havia a expectativa deste bom swell. E ninguém poderia imaginar que no dia seguinte o mar baixaria tanto e as ondas ficariam ruins. O certo teria sido rolar o penúltimo dia de competição nas “ondinhas” perfeitas de 2,5 metros e deixar o desfecho para o dia matador. Mas naquela altura, fazer um dia decisivo em ondas pequenas seria criticado por favorecer os brasileiros. E deu no que deu.
Adriano de Souza teve baterias complicadas e difíceis. No round 3 contra Jack Robinson, nas quartas de final contra Josh Kerr e a semi contra Mason Ho, estas duas últimas de notas baixas e tensas, por decidirem o título. Mineirinho não piscou em nenhuma delas. Fez o que tinha de ser feito, com surf de campeão. Fanning sempre havia se classificado antes e o peso ficava nas costas de Adriano, se perdesse... perdia o título.
Na final, já com o título mundial garantido, acredito que ele entrou totalmente relaxado, estaria feliz da vida caso Gabriel viesse a ser o campeão do Pipeline Masters, mas também não estava ali para brincadeiras. O script foi escrito como Deus quis e como Adriano de Souza fez por merecer. Mick Fanning foi um lorde, um cavalheiro duelando com lealdade e todas as suas capacidades até onde conseguiu.

JULGAMENTO

A bateria entre Mick Fanning e Gabriel Medina foi um divisor de águas no campeonato. Valia muito. Estava em jogo o título da Tríplice Coroa (US$ 50.000); abria as portas para Mineiro passar Mick (caso vencesse Mason Ho); a reputação dos juízes estava em jogo. No dia anterior em um mar maior e recheado de tubos, haviam tirado Filipe Toledo da briga em uma bateria polêmica em que precisava 2,27 e recebeu apenas 2,00 em uma onda em que ficou na porta do tubo, mas era de tamanho razoável e ABRIU, o que estava raro naquele momento do mar. Em quarenta minutos, lutando por um título mundial, Filipe achou apenas três ondas. E esta nota 2 nos instantes finais.
Os juízes da WSL tem um critério claro de julgamento e aplicam nas etapas. Em Pipeline, Teahupoo, Fiji você vai tirar notas altas se andar fundo dentro dos tubos. Em lugares como J-Bay, Snapper Rocks e Trestles dificilmente tirará uma nota alta com uma única manobra, por mais estratosférica que seja. Nesses picos as ondas são longas e o repertório no curso da onda dá o peso a nota. Há exceções.
Em Pipeline, no dia decisivo, o tempo foi passando e ficou claro que apesar de haverem tubos eles estavam “espremidos”, muitas vezes os surfistas tinham de forçar a saída em uma onda que se esfacelava, foi assim na onda que Fanning abriu a bateria semifinal conseguindo 7,33. A última onda de Medina, em que ele deu o aéreo, foi a décima primeira tentativa dele em uma bateria de 30 minutos. Mick abriu com a melhor nota da bateria, mas também ficou esperando e pelejando para encontrar outra nota (sua segunda onda somada foi um 3). Acho importante destacar aqui a obstinação de Gabriel em buscar a virada. Ele ficou atrás o tempo todo. Quando ele mandou um de seus aéreos absurdos, nos instantes finais, precisando de 5 e o juízes deram 6 foi (TALVEZ) o momento mais importante do ano.
Pode ter pesado o fato de terem tirado Filipe da briga de uma forma duvidosa? Pode. Pode ter pesado o fato de Medina já estar fora da briga pelo título mundial e aquele momento ser apenas uma “passagem” para a próxima bateria, de Adriano, que definitivamente iria decidir o título? Pode. Em minha opinião o trabalho dos juízes da WSL é espetacular e eles tem conduzido as disputas com um grau de acerto (justiça) extremamente respeitável. Dar o peso devido a uma manobra aérea, em Pipeline, em um dos momentos mais cruciais de toda a temporada, foi corajoso.
A situação, as regras do jogo, as cartas estavam na mesa, para que a peleja acontecesse da forma mais limpa e assim o foi. O mundo do surf se curva a Adriano de Souza e o nome dele está registrado como o primeiro campeão da Era WSL. A Liga Mundial de Surf, aliás, foi muito feliz com sua campanha “YOU CAN’T SCRIPT THIS” que lançou antes do desfecho do Billabong Pipeline Masters. O script foi o melhor possível para nós brasileiros. Imprevisível!? Poderia ter dado tudo errado, até Jadson André, que se classificou, poderia estar fora dos TOP do WCT em 2016. Porém, deu tudo certo para o Brasil. E de certa forma foi até previsível, pois trabalhamos para isso, fizemos o que tinha de ser feito. O script perfeito para nós. Dez atletas na elite em 2016. Temos o talento de Souza, Medina, Toledo e Ítalo Ferreira, entre os TOP 7 surfistas profissionais de 2015.
E mais glória a caminho...

ADRIANO MINEIRINHO, NO OMBRO DE GIGANTES
CARREGADO POR DANILO COUTO E JAMIE O’BRIEN

A vitória de Adriano vir no rastro do título de Gabriel Medina é uma confirmação do momento maior do surf competitivo brasileiro em sua história. E podemos esperar mais para os próximos anos. O Brasil, definitivamente, cravou seu nome como superpotência do surf mundial.
A briga pelo ROOKIE OF THE YEAR ao final de 2016 deverá ser uma das mais empolgantes da história e ganha representatividade, pois fazem muitos anos que não surgem 7 novos nomes na cena da WSL. Dois brasileiros, o campeão Caio Ibelli e Alex Ribeiro, dois americanos e três australianos devem lutar por esta supremacia do ESTREANTE DO ANO, com bem mais disputa do que foi encontrada por Ítalo Ferreira em 2015.

CAIO IBELLI NA INDONÉSIA, ESTA ONDA LHE RENDEU A CAPA DA REVISTA SURFING NO INÍCIO DA DÉCADA, PROMESSA CONCRETIZADA, VAMOS VER ATÉ ONDE CHEGA
 ÍTALO FERREIRA EM TEAHUPOO, PRONTO PARA ENTRAR NA BRIGA
QUARTAS DE FINAL EM FIJI, NO TAHITI E NA FRANÇA, UMA FINAL EM PORTUGAL O CREDECIAM COMO FORTE CANDIDATO A UM FUTURO TÍTULO DA WSL

Não pensem que os próximos anos serão de facilidade para o surf brasileiro. John John Florence ainda não entrou em sintonia de título mundial, mas acredito que seja uma questão de tempo. Jordy Smith é exatamente uma ano mais novo do que Adriano, se não se contundir, vai chegar junto. Julian Wilson e Owen Wright com certeza querem o caneco que Gabriel acaba de passar para as mãos de Adriano. Conner Coffin com certeza vai instigar Kolohe Andino a se tornar o próximo campeão dos USA. E Kelly Slater, o que será que esse “monstro” tem em mente?
Quem se arrisca a escrever um script para a próxima temporada? O ano de 2016 promete. Mas agora vamos virar o ano comemorando.

GABRIEL MEDINA FICOU MUITO FELIZ EM PASSAR A COBIÇADA TAÇA PARA ADRIANO MINEIRINHO EM PLENO PALANQUE DO BILLABONG PIPELINE MASTERS – IN MEMORY OF ANDY IRONS

O projeto para a concretização do livro “A GRANDE HISTÓRIA DO SURF BRASILEIRO”, continua firme e forte para 2016. Informo que o que seria um “livrão” de 420 páginas, já foi alterado para uma Enciclopédia de 5 VOLUMES, de 132 páginas, totalizando 660 páginas de história. São quatro anos de trabalho e os desdobramentos podem ser acompanhados neste blog desde 2012.


ESBOÇO DA CAPA E AMOSTRA DO PROJETO GRÁFICO
AUTORIA DE FERNANDO MESQUITA
VINHETAS DO ARTISTA TOM VEIGA


NO INÍCIO DO PRÓXIMO ANO TRAREI DETALHES SOBRE AS NOVIDADES
NAVEGUEM PELO SITE DO LIVRO:

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

ADRIANO MINEIRINHO CAMPEÃO DO MUNDO

Coroação de um ano mágico para o Brasil no surf

Adriano de Souza é campeão da Liga Mundial de Surf em 2015; o primeiro brasileiro a vencer o Pipeline Masters. Gabriel Medina é o primeiro brasileiro a vencer a Tríplice Coroa Havaiana. E isso não é tudo, no ano mais espetacular da história do surf brasileiro.


IMPORTÂNCIA SEJA DADA
CAPA DA FOLHA DE SP EM 18 DE DEZEMBRO DE 2015

Dado o cenário de seis candidatos ao título de 2015, nós brasileiros poderíamos sonhar, mas dificilmente montaríamos um “script” com dois brasileiros fazendo a final do mais prestigiado campeonato de surf do planeta.


O PERFIL DE ADRIANO E (TODAS) AS NOTAS DA FINAL
O SCORE DE 14,07 PONTOS DE MINEIRINHO NA BATERIA FINAL FOI O MAIS ALTO DO DIA DE ONDAS PEQUENAS E COMPLICADAS EM PIPELINE

Gabriel Medina conquistou a Triple Crown em uma bateria decisiva, difícil e empolgante, contra Mick Fanning. Quem vencesse ficaria o título da Tríplice Coroa Havaiana, veja abaixo o ranking final e o belo troféu que Gabriel adiciona à sua coleção.


GABRIEL MEDINA, DUAS FINAIS SEGUIDAS NO BILLABONG PIPELINE MASTERS
PRIMEIRO BRASILEIRO A VENCER A VANS TRIPLE CROWN OF SURFING

No penúltimo dia do campeonato as clássicas ondas de Pipeline mostraram sua imponência. Adriano de Souza atacou os canudos de backside e também de front, para o Backdoor. Focalizado em seu objetivo maior.


ADRIANO MINEIRO EM IMAGEM RECORTADA DO SITE SURFLINE


O resultado final, mais um dia de glória para o surf brasileiro nas águas e areias de Pipeline.
A lista com os 40 nomes dos campeões mundiais de surf profissional masculino. O Brasil entrou neste cenário nos dois últimos anos.


ABAIXO, RECORTES DA COBERTURA EM TRÊS DAS PRINCIPAIS PUBLICAÇÕES BRASILEIRAS


A FLUIR \ WAVES FEZ UMA COBERTURA ESPECIAL DO BILLABONG PIPELINE MASTERS


NA SURFAR DOIS BRASILEIROS DIVIDINDO O PÓDIO DO MAIS FAMOSO EVENTO DO SURF MUNDIAL


A HARDCORE TRAZ ADRIANO AGRADECENDO A FORÇA DE RICARDINHO DOS SANTOS
E A PRIMEIRA CAPA DA TEMPORADA COM 
ÍTALO FERREIRA – ROOKIE OF THE YEAR DA WSL

O título de Adriano de Souza, a vitória brasileira no Pipeline Masters, a conquista da Tríplice Coroa Havaiana por Gabriel Medina, são as façanhas mais recentes destes grandes surfistas brasileiros. O ano de 2015 ainda trouxe as três vitórias de Filipe Toledo em uma única temporada da WSL; o título de Caio Ibelli no disputadíssimo WQS; o título de Caio Vaz no mundial de SUP e Ítalo Ferreira como o melhor estreante da WSL.
Esta postagem fecha este ano mágico para o surf brasileiro, mas no começo do próximo ano trarei novas informações históricas que irão se somando na formatação deste projeto do livro “A GRANDE HISTÓRIA DO SURF BRASILEIRO”, tudo indica que finalmente teremos este Projeto Cultural aprovado para 2016.

CAPA COM PROJETO GRÁFICO DE FERNANDO MESQUITA
PRODUZIDA EM 2012


VEJAM A LEGENDA DESTAS FOTOS E MAIS DETALHES SOBRE O PROJETO NO SITE:

quinta-feira, 26 de novembro de 2015

EXTERMINANDO O COMPLEXO DE VIRA-LATA

Valorizando nossas realizações pioneiras

Na postagem anterior deste blog foi apresentado um trecho da entrevista com Ricardo Bocão, explicando sobre o seu processo criativo ao inventar as pranchas de 4 quilhas. Vamos trazer à luz mais alguns acontecimentos em que surfistas brasileiros tomaram uma frente influente, pioneira, e arrojada na evolução do surf.

ABERTURA DE UM DOS EPISÓDIOS DA SÉRIE “MAD DOGS” DO CANAL OFF
FOTO TIRADA COM CELULAR

O filme original, mais a brilhante série dirigida por Roberto Studart, também coloca alguns pingos nos “is”, em importantes acontecimentos históricos do surf, ao dar o verdadeiro valor aos surfistas brasileiros (baianos) que transformaram a abordagem da onda de Peahi, em Maui, de tow-in para surf na remada.
Mas esta é a mais recente das façanhas de brasileiros que irei destacar aqui. Selecionei 6 MOMENTOS, das seis últimas décadas, para dar um destaque. Estes são apenas alguns dos fatos isolados que tem a sua significativa perspectiva e serão abordados no livro A GRANDE HISTÓRIA DO SURF BRASILEIRO, projetado para ser lançado em 2016.

ANOS 60
PENHO E A PRIMEIRA MINI MODEL
Carlos Eduardo Siqueira Soares, foi o primeiro surfista brasileiro a se jogar para surfar no Hawaii, isso em 1967. Disputou o extinto e antológico campeonato de Makaha. Só que o ato pioneiro e transformador dele foi trazer a primeira prancha MINI MODEL para a América do Sul.

PENHO DE AZUL E OS AMIGOS PERUANOS GORDO E FLACO BARREDA
REPRODUÇÃO DE FOTO DO ARQUIVO PESSOAL DE PENHO

Aqui no Brasil ele conheceu e recebeu bem alguns amigos peruanos. Quando ele chegou no Peru foi recebido pela família Barreda, de alguns dos melhores surfistas de lá. O Peru já tinha uma tradição no surf, em 1965 Felipe Pomar venceu o World Contest, realizado em Punta Rocas e que contou com grandes surfistas do Hawaii, Austrália e Califórnia. Até 1967 o surf era praticado em pranchões.
Na temporada 1967 \ 68, já no Hawaii, Penho tomou contato com Bob McTavish, Nat Young, outros australianos e os shapers havaianos que aderiam ao movimento - Shortboard Revolution. Com a ajuda de John Mobley, que trabalhava na Pacific Surfboards, Penho produziu uma 7’2”.

DETALHE DAS PRANCHAS EM LIMA NO PERU
AS DUAS DAS PONTAS FORAM AS QUE PENHO TROUXE PARA O BRASIL
A MINI MODEL É A MENOR DA DIREITA
NA PONTA ESQUERDA UMA “BABY GUN” QUE ELE FEZ DEPOIS QUE PARTIU AO MEIO UMA IGUAL NO HAWAII

As três pranchas que estão no meio Penho ajudou e ensinou seus amigos peruanos a produzir. Flaco Barreda fez as primeiras mini models do Peru. No Brasil a chegada de Penho provocou a transição para um novo tipo de surf, no qual ele foi protagonista, uma espécie de guru, para a nova geração que passou a evoluir no ambiente das “pranchinhas”.

ANOS 70
A ERA DO PATROCÍNIO COMEÇOU NO BRASIL
Outro importante ato de pioneirismo, foi a busca pelos primeiros patrocínios. As pranchas eram limpas, tinham a marca do fabricante, um raio das pranchas Lightning Bolt. Entre os finalistas do Pipeline Masters em 1976, o brasileiro Pepê Lopes era o único que trazia um logo na prancha.

ACIMA, REPRODUÇÃO DE PÁGINA DO LIVRO DE ALEX GUTENBERG
PUBLICADO PELA EDITORA AZUL (FLUIR) EM 1989

ABAIXO, DETALHE DE PÁGINA DO PERFIL DE PEPÊ LOPES EM UMA REVISTA BRASIL SURF DO INÍCIO DE 1977, COM O LOGO DO JORNAL DO BRASIL EM DESTAQUE
É interessante destacar que foi na temporada 1976\77 que os australianos formaram a equipe “Bronzed Aussies” o time original era composto por Mark Warren, vencedor do campeonato Smirnoff em Sunset Beach; Ian Cairns que venceu a World Cup, em Haleiwa; e Peter Townend, primeiro campeão mundial da IPS. Só a partir de 1977 eles passaram a colocar o brazão da equipe na prancha, mas não havia nenhum patrocínio. Em dezembro de 1976 Pepê chegou com patrocínio (de bico) no Hawaii.

Ainda estou fazendo um cruzamento minucioso com as revistas importadas de minha coleção e as Brasil Surf para verificar as primeiras fotos publicadas e datas em que surfistas colocaram logomarcas (que não de fabricantes de prancha) como a principal.
No ano de 1978 o diretor da Brasil Surf, Alberto Pecegueiro, fez uma reportagem destacando esse fenômeno no Brasil. O fato que fica claro é que esta primeira geração de profissionais brasileiros foi pioneira na magnitude da captação de patrocínio, em uma época anterior ao crescimento da importância da surfwear.

REPRODUÇÃO DE ABERTURA DA MATÉRIA
PUBLICADA NA EDIÇÃO DE JULHO \ AGOSTO DE 1978

PÁGINA DA BRASIL SURF COM CAULI RODRIGUES (RADIO CIDADE) ACIMA E AS DUAS EMPRESAS DE REFRIGERANTES COM OTÁVIO PACHECO E DANIEL FRIEDMANN, ABAIXO
FOTOS DE NILTON BARBOSA

ANOS 80
ORGANIZAÇÃO DE CAMPEONATOS “MODELO”
Na segunda metade dos anos 80 com o retorno do circuito mundial ao Brasil e a formação da Abrasp a partir de 1987, começamos a realizar competições (festivais) de surf cada vez mais bem organizados e estruturados.

O SUNDEK CLASSIC DE 1988 PASSOU DE UM EVENTO ABRASP, PARA UMA ETAPA DA ASP, VALENDO PONTOS PARA O TÍTULO MUNDIAL. FOI MONTADA UMA GRANDE ARQUIBANCADA EM ITAMAMBUCA QUE LOTOU

A grande razão para esta excelência em termos de realização de campeonatos se deu em função do surgimento de uma geração de profissionais que buscaram um aperfeiçoamento na montagem destes eventos. Desde Paulo Issa em Ubatuba, passando pelos cariocas Arnaldo Spyer e Roberto Perdigão, que seguiram para o Sul e se juntaram a Flávio Boabaid, ganhando a colaboração de produtores como Dany Boi, tudo viabilizado pela visão dos empresários da surfwear brasileira como Sidão, Alfio, Fico, Zé Roberto Rangel, os irmãos Rego e Ermínio Nadin que deram o suporte para que passássemos de copiar as estruturas internacionais, para gerar modelos e magnitudes que foram copiadas mundo a fora. Fizemos escola nesse quesito.

REPRODUÇÃO DE PÁGINA DA REVISTA INSIDE
COM FLÁVIO BOABAID NO MEGAFONE (À ESQUERDA), SIDÃO E ROBERTO PERDIGÃO COM SEU CLÁSSICO BIGODE, MAIS AO FUNDO
FOTOS: FLÁVIO VIDIGAL

ANOS 90
WEBCASTS, INVENÇÃO BRASILEIRA
Neste blog já fiz uma postagem sobre o trabalho da Beach Byte e as inovações que tiveram sua origem com uma turma de Niterói, Mano Ziul, Celsinho e Alexandre Cury. Vejam um pouco desta história no link abaixo:
http://surfdragonblog.blogspot.com.br/2014/11/evolucao-dos-webcasts.html


EM 2006, NO EVENTO BILLABONG GIRLS EM ITACARÉ, FOI INAUGURADO O SISTEMA DE REPLAY PARA OS JUÍZES. À ESQUERDA O TERMINAL PARA DIGITAR AS NOTAS E DO LADO DIREITO O MONITOR PARA CADA JUIZ VER O SEU REPLAY SEM PERDER A ATENÇÃO DA ÁGUA.

ANOS 2000
MÁQUINAS DE SHAPE ESPALHADAS PELO GLOBO
Ainda nos anos 90 o surfista, médico e shaper das Surface Surfboards, Luciano Leão, começou a conceber a máquina DSD (Digital Surf Designs), nos anos 2000 o invento se provou tão eficiente e funcional que era a máquina instalada em maior quantidade pelo mundo afora.

IMAGEM FEITA COM MEU CELULAR DA MÁQUINA SURF CAD – DSD
REPRODUÇÃO DO FILME “LINHAS, ARCOS & CURVAS” DE PEDRO CEZAR

Todos estes episódios e a evolução natural deles serão abordadas com maior profundidade e de forma mais elaborada no livro A GRANDE HISTÓRIA DO SURF BRASILEIRO, este blog, que vai funcionar em paralelo com a produção e o lançamento do livro, estará registrando diversas informações que ficarão disponíveis para pesquisa dos interessados.
Para finalizar esta postagem, o assunto (façanha) mais recente e que me deu a ideia do título. Peguei apenas seis temas, distribuídos por seis diferentes décadas, mas que podem encher de orgulho todos os surfistas brasileiros por sua representatividade no cenário internacional.

ANOS 10
OS MAD DOGS E A REMADA EM JAWS
Danilo Couto venceu o prêmio Billabong XXL em 2011 e continuou atacando as ondas de Jaws, para a esquerda e para a direita, com ou sem patrocínio, ao lado de seus corajosos amigos da Bahia, Márcio Freire e Yuri Soledade.  

DANILO COUTO INSCRITO NA CATEGORIA MAIOR ONDA NA REMADA EM TEMPORADA RECENTE. FOTO: FRED POMPERMAYER

O filme Mad Dogs gerou grande polêmica por seu nome não estar na lista dos convidados para o evento de Peahi da WSL. Ele sempre foi um dos maiores destaques lá nas sessões de remada. Este ano ele ainda está como um dos primeiros alternates do Quiksilver – In Memory of Eddie Aikau. A expectativa é que Danilo Couto consiga participar dos dois eventos, caso aconteçam.

DANILO COUTO EM ENTREVISTA AO FOTÓGRAFO BRUNO LEMOS PARA O CANAL WOOHOO. ELE ESTÁ DE PATROCÍNIO NOVO E PRONTO PARA AS BOMBAS
OS MAD DOGS ORIGINAIS: YURI SOLEDADE, MÁRCIO FREIRE E DANILO COUTO
FOTO: RICARDO CALIL, EXTRAÍDA DO SITE GLOBALGARBAGE.ORG

As incríveis aventuras dos surfistas brasileiros nas ondas grandes e seus big riders serão temas deste blog em diversas ocasiões. Lembrando os feitos do passado e também trazendo a concretização de sonhos de superação atuais, simplesmente porque a história nunca acaba de ser escrita.

terça-feira, 17 de novembro de 2015

BOCÃO – PARTE 2 – AS 4 QUILHAS

Colocando alguns pingos nos “iiiis”

Ricardo Bocão já foi protagonista de uma postagem deste blog, em julho de 2014. Aqui vamos falar especificamente de sua invenção em design, as pranchas de 4 quilhas.

REPRODUÇÃO DA ABERTURA DE MATÉRIA DE AUTORIA DO FOTÓGRAFO BRUNO ALVES PUBLICADA NA FLUIR NÚMERO 3, NO INÍCIO DE 1984

Bocão teve o insight para inventar as pranchas de 4 quilhas em 1981. Minha ideia para fazer esta postagem surgiu ao reler na mais nova Fluir, a edição de aniversário, na qual saiu publicada uma matéria que fiz com a entrevista de Penho (Carlos Eduardo Siqueira Soares), para o projeto de pesquisa do meu livro. O editor chefe, Adrian Kojin, viu um teaser neste blog, em uma postagem sobre Saquarema e me solicitou que desenvolvesse um texto especial, mais abrangente. A matéria saiu com 14 páginas e certamente seria impossível colocar todas estas informações, tanto da matéria na Fluir, como os detalhes apresentados aqui neste blog, no livro. Ambos, Penho e Bocão, foram pioneiros e instrumentais no desenvolvimento dos designs.
O insight para fazer esta postagem (e o título) veio do fecho da introdução que Adrian preparou:

REPRODUÇÃO DA INTRODUÇÃO DA MATÉRIA SOBRE PENHO
CLICK E AMPLIEM QUE É POSSÍVEL LER
PENHO 
ABERTURA PUBLICADA NA FLUIR DE OUTUBRO 2015
EDIÇÃO DE 32 ANOS
FOTOS DO ARQUIVO PESSOAL DE PENHO;
TITO ROSEMBERG (ARPOADOR) ; FEDOCA (PÍER)

CAPA DA EDIÇÃO DE ANIVERSÁRIO
JOHN JOHN FLORENCE, TAHITI
FOTO: DOMINIC MOSQUEIRA

Voltando ao assunto principal deste post, as 4 quilhas de Ricardo Bocão, coloco abaixo mais um trecho da grande entrevista que fiz com Bocão, na sede do Canal WooHoo, em maio de 2013. Fiz edições mínimas, resguardando a espontaneidade com que ele me contou esta história. Bocão ainda está preparando um livro, com Marcelus Viana do Canal Off, trazendo a história completa das Quatro Quilhas.

 BOCÃO E SEU QUIVER DA TEMPORADA 1981 \ 1982
SUNSET PARKING LOT
FOTO: PAUL COHEN
REPRODUÇÃO DA VISUAL ESPORTIVO Nº 14

Com a palavra, Bocão, colocando outros pingos nos Is:
“Inventei as pranchas de 4 quilhas em maio \ junho de 1981, logo depois que o Simon Anderson apareceu com as pranchas de 3 quilhas (Thrusters). A história do Simon Anderson é muito simples e a história das 4 quilhas também é muito simples. Simon Anderson inventou a 3 quilhas, ou melhor, apareceu para o mundo com a 3 quilhas a primeira vez na Semana Santa de 1981, em Bells Beach. E chocou ao ganhar o campeonato em Bells com 15 pés de onda, usando um modelo de prancha diferente.

O que que o mundo surfava na Semana Santa de 1981, quando ele ganhou Bells?
Biquilhas.
Todo mundo usava as biquilhas que Mark Richards havia recriado em 1979. De 78 para 79. MR começou a dominar o circuito mundial, ganhou quatro títulos seguidos. No meio desse processo, no início de 1981, ou até no ano de 1980, quando começou o terceiro ano do domínio dele de biquilha... Lembre que todo mundo surfava de biquilha (a não ser no North Shore – mas isso era para ondas grandes). Tinha um ou outro surfando de single fin, o Cheyne Horan era um rebelde, mas todo mundo usava biquilhas. Eu, você... Para o surf hot dog e até um pouquinho maior, todos usavam biquilhas. Essa era a prancha comum.
Veio o Simon Anderson e ganha Bells, que quebrou pequeno, médio e depois veio aquele swell de 15 pés. Ele de triquilha. E todo mundo: ‘Uau, que prancha é essa?!!’ Ninguém tinha visto.
E três semanas depois ele venceu o Coke, em Narrabeen. Ninguém pode negar que a aceitação imediata das 3 quilhas veio por conta disso. Ele vai lá e venceu Bells em ondas de 15 pés e semanas depois, na mesma perna do circuito mundial, de costas para a onda, em ondas pequenas, ele venceu o Coke, em Sidney. Foi uma febre. Imediata, instantânea.
E aí, o Valdir Vargas que estava lá, na Austrália, sai de lá, passou por Bali para pegar umas ondinhas e chegou no Brasil com uma McCoy de 3 quilhas. No meio de 1981 ele chegou com a primeira 3 quilhas no Brasil.

O Penho trouxe a primeira mini model para o Brasil, eu acho que o Valdir chegou aqui com a primeira triquilha. Eu tenho certeza. Fica faltando alguém provar que não foi. E lembre-se, que em 1981 não havia internet, surf na TV, a informação não corria tão rápida. A informação era boca a boca. A Visual Esportivo, que era a única revista, demorava dois meses para sair. Quando ela saia tinha assuntos de quatro meses atrás. E a Surfer americana idem, que chegava aqui de navio.
Então, quando o Valdir chegou com a 3 quilhas aqui, ninguém nem sabia direito o que estava acontecendo.

Nessa época eu shapeava para umas 4 a 5 pessoas, Ismael Miranda, Rosaldo Calvalcanti, Gironso, Fernando Bittencourt e eventualmente para Moisés Levy e Rodolfo Lima (meu time eram estes quatro primeiros surfistas, depois três, pois o Fernando foi para o Daniel Friedmann). Com o Rosaldo Cavalcanti, que já era um cara antenado, novinho, a gente já havia ouvido falar dessa história das 3 quilhas, mas aí o Rosaldo chegou dizendo que o Valdir havia chegado no Brasil com uma prancha destas e falou para mim: ‘Eu quero uma, vamos pedir emprestada a dele para você copiar’. Eu liguei para o Valdir, passei lá e peguei.
Na ida para a oficina da Brazilian Dreams, eu shapeava lá, o Capacete (Ítalo Marcelo), também shapeava lá, eu não tinha oficina. Era uma oficina de laminação onde tinham diversos shapers. Na ida o Rosaldo fala assim: ‘Vamos dar uma surfadinha’; só para sentir a prancha. Eu achei a prancha uma merda, achei ela dura. Ela era reta, sem V Bottom, era uma daquelas needle nose, com rabeta larga. Um squash largão e o fundo era flat. Uma prancha dura, com a borda box, assim... (Bocão mostra a borda com a mão). Eu achei horrível. Falei para o Rosaldo e ele. ‘Não quero saber, quero que você me faça uma igualzinha’. Tá bom. Vou fazer uma igualzinha para você.
Eu saí da água. E uma das coisas que eu achava que deveria fazer, antes de entrar no carro para ir para a oficina, eu virei a prancha e coloquei ao lado da minha biquilha. Eu havia levado a minha prancha, surfei um pouquinho com as duas. Eu virei assim a minha prancha e virei a triquilha. As pranchas de fundo para cima, com as quilhas e botei elas lado a lado, me afastei um pouquinho e fiquei olhando. Eu só queria olhar, o fundo de uma, fundo da outra, as quilhas... As quilhas da minha e as quilhas da McCoy e numa dessas, quando eu virei as quilhas, EU VI – duas quilhinhas atrás.
EU VI. Já li sobre isso, a maioria dos inventores, da lâmpada, do dínamo, eles foram pensados, concebidos na cabeça dos caras, antes de fazer. O cara viu um dínamo funcionando, depois ele foi atrás fazer. Thomas Edison viu a lâmpada funcionando e depois foi procurar como fazer. Não todas as invenções, mas algumas o cara concebeu antes.
Eu já havia tido uma porrada de ideias e os caras brincavam comigo, que eu botava outline de rabeta no bico, eu estraguei várias pranchas antes disso. Eu tinha essa particularidade, ficava tentando inventar coisas diferentes. Eu insistia em surfar com pranchas horríveis. Algumas eu realmente estraguei. Eu não era de fazer o que todo mundo faz. Meu estilo de vida era totalmente diferente. Eu já praticava esse tipo de coisa. Uma constante busca por uma coisa nova. Fui ligando as coisas na mente e falei ‘Caraca, Rosaldo, tive uma ideia’. E ele, ‘Não vem não, eu quero minha prancha desse jeito’, mas eu cheguei na oficina e a primeira coisa que eu fiz foi fazer a minha 4 quilhas.
Coincidente eu tinha uma 5’8”, que seria uma biquilha que já estava laminada de um dos lados, com uma pintura daquelas geométricas da época, prontinha. Ela só não tinha as quilhas. Eu me lembro como se fosse hoje. Quando eu cheguei lá a prancha estava no cavalete, pronta para colocar as quilhas e já estava com as duas quilhas com aquele tape (fita crepe) para fixar na posição. Faltava dar o roving e laminar dos dois lados. Dar o hot coat embaixo e fixar as quilhas. De fato, era laminar as quilhas e dar o hot coat no fundo. Eu falei – para aí. Me dá uma quilha, peguei um papel e desenhei uma quilha grande de biquilha normal, cortei três dedos da base. Falei: ‘Faz duas quilhas dessa para mim, urgente’. Na época tinha aquelas bandejas de quilhas que o cara cortava várias. Quando ficaram prontas fui colocar com o laminador, onde eu achava que era para coloca-las.
 RÉPLICA DA CRIAÇÃO DE BOCÃO DO ACERVO DA ALMA SURF
ROMEU ANDREATTA ME CONVIDOU PARA FAZER A CURADORIA DE 50 RÉPLICAS DE PRANCHAS HISTÓRICAS DE DIFERENTES SHAPERS
A QUATRO DE BOCÃO FOI UMA DAS ESCOLHIDAS
FOI FEITA POR RICARDO MARTINS, NA OFICINA DA WET WORKS
COM AS MEDIDAS FORNECIDAS POR BOCÃO


FOTOS: DRAGÃO – FESTIVALMA 2009

Simples meu irmão. Se eu vi duas quilhas atrás, elas deveriam ser na mesma direção e no mesmo ângulo e também na mesma distância da borda, só que um pouco mais para trás. Exatamente paralelas. O que eu tive de decidir ali era o quão para trás eu deveria coloca-las. Fixei e mandei laminar. Aí começou.
Começou a zoação. Geral. De todo mundo. E não parou mais durante dois anos. Que eu me lembre não teve um, a não ser o Joca Secco, que foi o único que chegou para mim e falou: ‘Pô, essa prancha tá andando rápido, hein?’
Eu peguei essa prancha e estreei ela num dia de ondas boas atrás do Pontão no Arpoador e a característica dela ficou clara, logo de início, que era a velocidade. E o Arpoador era bom para isso. Eu nem manobrei tanto. A quatro quilhas tinha a mesma soltura da biquilha só que com mais drive. Mais pressão. Mas 99% das pessoas achavam que eu estava querendo aparecer. A força das pranchas de 3 quilhas era avassaladora. É óbvio que o impacto do meu negócio iria ficar amortecido.
Isso foi em junho, eu resolvi que eu ia colocar um anúncio na Surfer e na Sunfing, em preto e branco. Era US$ 1.500 cada um, cheguei até a escrever uma carta para perguntar sobre preços. Eles me responderam. Seria um anúncio assim: 4 QUILHAS – RICARO BOCÃO, só para registrar.  Aí já era agosto para setembro de 1981, quando recebi a resposta deles. E aí eu pensei: ‘Quer saber, vou gastar 3 mil dólares, para colocar dois anúncios...’ Com estes 3 mil dólares eu vou para o Hawaii, vou entrar no Pro Class Trials, tentar entrar no campeonato de Sunset e no Pipeline Masters, vou levar só um quiver de 4 quilhas e empurrar este modelo goela abaixo dos caras. Os caras vão ter que ver. E foi o que eu fiz. Juntei o meu dinheiro que eu usaria no anúncio, fui para o Hawaii, com um quiver de 4 quilhas: 5’8”, 6’8” e duas 7’4”. Eu tinha duas dessas maiores. Até o Picuruta utilizou uma com seda da Gledson emprestada. Eu ainda tinha uma 7’10” do BK – Barry Kanaiaupuni e uma 9’4” (ambas monoquilhas) e este era o meu quiver.
Dali eu fiquei dois anos usando 4 quilhas em tudo. Fui para a África do Sul duas vezes. Os dois primeiros OP Pros da Califórnia em 1982 e 1983 eu surfei de 4 quilhas. No Festival Olympikus eu fiquei em nono duas vezes. Perdi nas duas vezes apenas para o campeão. Para o Luís Neguinho no primeiro e para o Picuruta no segundo, mas passei as triagens, disputei o primeiro homem x homem, que era os Back 14 e também a segunda rodada (Top 16) e fiquei em nono. Usando só 4 quilhas.
A única coisa que mudou é que no meio desse caminho eu fiz algumas pranchas com aquele ‘bico de pato’. Aí todo mundo achou que não deu muito certo, mas foram estes bicos. Os bicos de pato foram apenas um pedaço dessa história. Isso durou só quatro meses. Mas, em um período de dois anos, cheguei a fazer umas 45 a 50 pranchas de 4 quilhas. E mesmo em ondas de bom tamanho no Hawaii eu surfei com a 4 quilhas.”

TESTANDO SEUS DESIGNS NO NORTH SHORE EM 1983
FOTO: PAUL “GORDINHO” COHEN

ABERTURA DAS MATÉRIAS SOBRE SEU DESIGN NAS REVISTAS BRASILEIRAS
VISUAL ESPORTIVO NÚMERO 14, DE 1984

FLUIR NÚMERO 3, TAMBÉM DE 1984

 VENICE MAGAZINE DE JUNHO DE 2008
MATÉRIA DE KIKO CARVALHO
(repare nas “bicos de pato”)
FUI CONVIDADO PARA ESCREVER UM BOX AO FINAL
FORAM 8 PÁGINAS USANDO A MATÉRIA DA VISUAL COMO PANO DE FUNDO




CAPA DA VENICE NA QUAL SAIU ESTA MATÉRIA


RECORTE DE UMA PÁGINA DUPLA DA FLUIR NÚMERO 3
ISMAEL MIRANDA, TEAM RIDER DO BOCÃO, É O SURFISTA GOOFY

REPRODUÇÃO DA VISUAL ESPORTIVO

 REPRODUÇÃO DA FLUIR NÚMERO 4
TEXTO ASSINADO PELO SHAPER ALEXANDRE MORSE
PAULO ISSA LAMINANDO UMA 4 QUILHAS NA SQUALO

FERNANDO MURRINHA, PIONEIRO DO SURF NORDESTINO
ESTA 4 QUILHAS ELE FEZ COM BASE NA MATÉRIA DA VISUAL ESPORTIVO
INÍCIO DOS ANOS 80
FOTO: CLÁUDIO MARANHÃO
  
Esta segunda postagem, tendo Ricardo Bocão como protagonista neste blog, com certeza não será a última. Ainda guardo um trecho da entrevista que fiz com ele, explicando o pioneirismo em termos de patrocínio, que merece um destaque especial. Saibam, que neste quesito, os brasileiros também fizeram ANTES que australianos e norte-americanos. Minha pesquisa continua e trarei depoimentos de Cauli e outros de nossos primeiros pros.

Na verdade, este blog não vai parar de trazer as histórias que causaram impacto na evolução do surf brasileiro. Esta atitude pioneira de Bocão estará no seu capítulo como ícone de nosso surf e também deve ser abordada quando falamos do desenvolvimento de pranchas por brasileiros. O design de pranchas nacionais que pode começar com as madeirites de Irencyr Beltrão, passando pelas mini models de Penho (que inclusive as introduziu no Peru – leiam a matéria na Fluir – N. #360 – OUT 2015), culminado com os designers atuais, as máquinas de shape de Luciano Leão, espalhadas pelo planeta. O modelo de máquina desenvolvido por Avelino Bastos, que puxa duas pranchas de forma concomitante e traz outros avanços que facilitam a vida dos shapers, aos foguetes que Marcio Zouvi, Johnny Cabianca e Xanadu fazem para Filipinho, Medina e Caio Ibelli destroçarem as ondas do Tour...

Todos estes assuntos serão abordados no livro “A GRANDE HISTÓRIA DO SURF BRASILEIRO”, que tem seu lançamento programado para 2016.

VEJAM DETALHES NO SITE: WWW.HSURFBR.COM.BR

Para conhecer um pouco mais sobre a história de Ricardo Bocão: