segunda-feira, 30 de setembro de 2013

CAPÍTULO 4


Os ÍCONES do surf brasileiro serão apresentados em capítulos de oito páginas

Este é o esboço do quarto capítulo do livro “A Grande História do Surf Brasileiro” (conheça o projeto navegando no site: http://www.hsurfbr.com.br/). Os sete primeiros capítulos serão lançados aqui neste blog até o final do ano. O livro impresso tem sua previsão de lançamento para 2018 e conta com mais de cinquenta capítulos.
As prévias aqui apresentadas estão em fase de construção e serão moldadas para o livro. Durante a fase do projeto de pesquisa, as informações serão cruzadas para que obtenhamos a máxima correção. Aqui no blog é possível ilustrar de forma mais descontraída, para o livro impresso todos os créditos, datas, locais serão confirmados.
As quatro ilustrações finais são um esboço da estética proposta para o livro, que terá o tratamento de direção de arte por parte de Fernando Mesquita. Todas as sugestões para a melhoria do projeto são bem-vindas. 
No final de outubro virá o Capítulo 5, de MEMÓRIAS, abordando a transformação das madeirites para as pranchas de fibra. Acompanhem...

Capítulo 4

DUPLA DE ABERTURA - INTRODUÇÃO
(vinheta) ÍCONE (by TOM VEIGA)

RICO DE SOUZA

Ricardo Fontes de Souza começou a surfar de pé sobre uma prancha de madeirite em 1964. Vivendo sua infância no Leblon ele já pegava ondas de jacaré e com uma planonda, antes disso. Se tornou um surfista respeitado ao vencer por dois anos seguidos (1972 e 1973) o Festival Nacional de Ubatuba, que foram os primeiros grandes campeonatos Brasileiros de Surf. A competitividade sempre foi uma de suas características, mas o que transforma Rico em um dos ícones do surf brasileiro é o espectro de seu envolvimento com o esporte.
Além de atleta Rico atuou como shaper, organizador de eventos, lojista, lançou marca de confecção com seu nome, boletim de ondas, site na internet, criou blog, pioneiro com as escolas de surf em nosso país, atuou em campanhas publicitárias, representou o Brasil internacionalmente sendo um dos mais reconhecidos surfistas brasileiros no exterior. Viajou por diversos países surfando e competindo, espalhando o Espírito de Aloha, sua simpatia e carisma, fazendo amigos nos quatro cantos do planeta. Um surfista diversificado esteve no Planalto Central e nas favelas... E se mantem com qualidade de surf além dos 60 anos.


DUPLA 2 – A FOTO
Os ícones do livro são convidado a escolher a foto preferida de suas carreiras para estampar a segunda página dupla de seu perfil no livro. Rico destacou este momento em Sunset Beach, da temporada havaiana 1977\78, a foto foi tirada por seu amigo Bernie Baker, um dos organizadores da Tríplice Coroa Havaiana. A praia de Sunset é o pico preferido de Rico no Hawaii, uma onda desafiadora e de personalidade mutante. Se somarmos as horas que Rico passou no line up de Sunset não me espantaria se este cálculo chegasse a mais de um ano inteiro dentro d’água.


Veja o que Rico comentou sobre esse dia: “Sempre gostei do Hawaii pela variedade de ondas, direitas, esquerdas, ondas cheias, tubulares... Peguei muita afinidade com Sunset por ter morado ali na casa do Randy Rarick em diversas ocasiões, é a minha onda preferida no mundo. Mesmo estando acostumado e sendo minha onda preferida é um desafio enorme, uma onda que quebra grande. Nunca podemos dar mole ali porque ela te ‘papa’. É uma onda muito difícil de surfar. Essa foto foi tirada em uma competição, o Pro Class Trials, em 1978. Eu estava em uma bateria muito difícil. As ondas estavam vindo de oeste gigantes, maravilhosas, o auge do auge e veio essa onda incrível. O Bernie Baker estava colocado com sua câmera ali para o lado da torre dos salva-vidas com uma lente poderosa e tive a sorte dele pegar este momento. Eu estava com uma prancha gun do Tom Parrish. Sunset com 12 a 15 pés é maravilhoso, seja com ondulação de oeste, ou então de norte. Até hoje é minha onda preferida. Este mar me marcou muito.”





DUPLA 3 – MOMENTOS DA CARREIRA


Primeira foto de Rico surfando tirada em 1966 no Arpoador.
Foto: ARQUIVO PESSOAL



Em sua oficina de pranchas na Guaratiba.
Foto: Sergio Leandro - ARQUIVO PESSOAL



Reprodução de foto de Klaus Mitteldorf, publicada em edição especial da revista Super Surf. Competindo em Itamambuca.
Foto: Klaus Mitteldorf



Rico de pé de short branco, com uma turma da pesada em Saquarema, início dos anos 70. Foto obtida em seu blog: http://globoesporte.globo.com/platb/ricodesouza/
Foto: ARQUIVO PESSOAL



Expedição brasileira para a África do Sul em 1976. Rico agachado na esquerda, ao lado de Bocão; Daniel Friedmann apoiado na porta do Fusca; Flavio Dias da Brasil Surf olhando para Maraca, com as mãos na cintura.
Foto: ARQUIVO PESSOAL



Na segunda metade da década de 70 a TV Globo patrocinava Rico bancando suas passagens.
Foto: Paul “Gordinho” Cohen



Stretch “hang five” na sala de shape. Com pedigree de longboard Rico era especialista neste tipo de abordagem também nas ondas, com pranchinhas que ainda tinham boa flutuação no bico.
Foto: Serginho Leandro - ARQUIVO PESSOAL



Reprodução do livro BOAS ONDAS – Surfando com Rico de Souza (Ediouro) publicado em 2004. A partir da esquerda: Cauli, Rico, Otavio Pacheco, Jean Noel, Bocão e Cacau Falcão, finalistas de Ubatuba em 1978.
Foto: Nilton Barbosa



Foto da galera da Escola de Surf Rico no início dos anos 2000. Rico vibrando de camiseta branca ao centro.
Foto: Zé Roberto (reprodução do livro BOAS ONDAS)



Capa do livro lançado em 2004, com o filho Eric Souza.



Foto: reprodução de página dupla do livro BOAS ONDAS, fotos de Rick Werneck e Gordinho (Paul Cohen).




Atrás dos recordes do Guiness.
Fotos: ARQUIVO PESSOAL



Reprodução de anúncio publicado na revista Alma Surf em 2008. Rico aderiu “com qualidade” ao SUP.



Palestrando na USP.
Foto: Ibrasurf.



DUPLA 4 – O DIA MÁGICO DE SURF
Sessão Memorável


Em 2005 nas Ilhas Mentawai (Indonésia) Rico viveu um de seus mais inesquecíveis momentos surfando, o fotógrafo Fernando Mendonça Lima estava lá para registrar, vamos ao relato: “Tive o prazer de ir a Bali pela primeira vez em 1976. Fui com Rory Russell, Michael Ho e outros amigos gringos. Voltei outras vezes, mas em 2005 fui convidado para uma viagem às Mentawai, no barco estava uma garotada nova, um dos filhos de João Maurício, o Kalani Jabour, meu amigo das antigas Ian Robert e o fotógrafo e surfista Fedoca. De Bali fomos para as Mentawai, no primeiro dia fiquei impressionado com Lances Rights, pela força da onda, pelo tubo e pela perfeição. Uma bancada perigosa, muito rasa. No final do dia nosso barco contornou a bancada e ancoramos em Lances Lefts, surfamos umas ondas de uns 6 pés no final de tarde e logo escureceu. Os outros barcos que estavam nesta bancada foram embora a noite, no dia seguinte amanheceu apenas com o nosso barco no pico. Logo cedo caíram Ian Robert e Fedoca. Eu olhava as ondas do barco, estava muito longe, achei legal... Mas quando eu caí na água, percebi que tinha uns 8 a 10 pés e no meio do dia entraram séries ainda maiores (foi quando a garotada entrou) e estava tão perfeito que não dava medo. O mar estava tão bom e tão perfeito que não transmitia medo.” Fedoca, que estava ao nosso lado no momento desta gravação comenta: “Espera aí. Pra você né – risos!!!” Rico continua: “Estava muito perfeito, limpo, as séries vinham pausadas, acho que o período estava uns 17 segundos. Normalmente um mar de 12 pés dá medo, mas eu estava confortável neste dia. Eu estava com uma prancha que eu havia feito para o Afrânio e ela funcionou horrores! Uma prancha para ondas grandes. Fui pegando confiança na prancha e o mar subindo... Veio uma série de uns 12 pés, que lavou todo mundo. Tomei na cabeça, mas este mar estava com uma perfeição absurda e foi uma das melhores sessões de surf que tive em minha vida, porque era perfeito, grande, sem crowd, só os amigos, um dia de sol. Esta sessão reuniu todos os ingredientes. O surf para mim é prazer, não era uma competição, as condições estavam perfeitas, foi pura diversão. Você consegue surfar no melhor de sua capacidade. Foi uma sorte não chegar outro barco com mais dez surfistas australianos.” Fedoca destaca: “No melhor momento do mar estavam na água ele, o Ian e o Kalani. Eu estava num zodiac para fotografar mais de perto, usando uma lente 70-300. Nosso barco estava ancorado mais longe. O canal era perfeito, tipo Sunset, não quebrava nada no canal. Quando entrava a série, era só o surfista se posicionar mais para a esquerda, ou direita, em função do tamanho.” Rico descreve a onda: “Era um drop radical, mas muito agradável, quando dropava dava para ter a certeza que eu ia me dar bem, o mar estava liso, um leve terral, eu estava com a prancha certa. No inside ela fazia um buracão, dava para colocar pra dentro. Em termos de diversão foi uma das caídas mais memoráveis da minha vida.”




Fotos: Fedoca.


FICHA TÉCNICA - TIMELINE
Ricardo Fontes de Souza
NASCEU - 12 de Junho de 1952 – Rio de Janeiro
Residiu por toda a vida no Rio (no início Leblon – hoje na Macumba).
  • 1964 começou a surfar de pé com uma madeirite.
  • 1966 adquiriu a S. Conrado N. 042.
  • 1968 venceu a categoria junior do Campeonato da Ilha Porchat, em São Vicente, já surfando com uma prancha Gordon & Smith, shape de Mike Hynson.
  • Final dos anos 60, começou trabalhando (shapeando) na São Conrado, depois já independente, primeiro descascava pranchões antigos, mais tarde passou a comprar do Coronel Parreiras blocos do poliuretano marrom da Bayer.
  • Final dos anos 60 lança a marca RICO Surfboards, o desenho original gótico foi uma criação de Horácio Seixas, que até hoje trabalha como laminador no Hawaii.
  • 1970\71 – Foi para o Peru, primeira viagem internacional. Penho e Maraca estavam lá. Conheceu Gerry Lopez, Felipe Pomar, Barry Kanaiaupuni, Joey Cabell, Mike Purpus, Paul Strauch, Ben Aipa...
  • 1972 e 1973 Campeão do Festival Nacional de Ubatuba.
  • 1972 foi para o Mundial Amador da ISA (ISF). Único Brasileiro a competir em San Diego. Ficou 2 meses na Califórnia.
  • Hawaii temporada 72\73, ficou com Peter Townend, Mark Warren, Ian Cairns, mais peruanos e africanos... Fortaleceu amizade com Randy Rarick.
  • 1973 – participou com destaque no evento Sea Spirit em Haleiwa e depois Chun’s Reef.
  • 1973 – trouxe filmes de surf para o Brasil.
  • 1974 – Venceu Campeonato Magno.
  • 1974 Viajou pelo Nordeste com Randy Rarick da Bahia a Fortaleza, foram até Fernando de Noronha, com Sergio Fireman e o amigo Trapa da Bahia.
  • 1975 na África do Sul deu a ideia para Randy vir organizar o primeiro Internacional do Rio, que foi bancado pelo pioneiro Bruno Hermany.
  • 1976 \ 77 consegue patrocínio da TV Globo.
  • Final dos anos 70 loja Surfart – Leblon
  • 1981 – Confecção Rico
  • EQUIPE RICO – Roberto Valério, Cauli Rodrigues, Valdir Vargas, Fred d’Orey...
  • 1982 – Escola de Surf
  • 1983 – Boletim das Ondas na FM - Fluminense “Maldita” depois Transamérica \ Radio Cidade \ Oi FM \ Mix FM \ MPB Brasil \ Bradesco FM. (30 anos)
  • DISKSURF com a Telemar
  • 1987\88\89 – Campeão Brasileiro de Longboard da Abrasp
  • 1988 – Vice-campeão Mundial Amador (ISA)
  • 1989 – Vice-campeão Mundial Profissional (ASP)
  • Eventos (promoção) – começou com a Copa Rico – Coca-Cola de Longboard ainda nos anos 80; anos 2000: Petrobras Longboard Classic; Festival Ecovias.
  • Anos 90 – Museu do Surf.
  • 2000 – RicoSurf.com + BLOG na globo.com.
  • Participações comerciais Chevrolet, Leader...
  • Nome inscrito no Guiness (Livro dos Recordes).
  •  


MAIS MOMENTOS DE SUA CARREIRA
No topo do pódio em Ubatuba no início dos anos 70.

Além de shapear, Rico laminava e polia as suas primeiras pranchas.

Com sua mega prancha na praia da Macumba – RJ.



Com Fred Hemmings em Maresias no Surf & Beach Legends de 1999.

Em frente a um outdoor da Sprite, África do Sul anos 70.

Equipe Rico no Stubbies de 1981 na Gold Coast - Austrália. Fred d'Orey, Valério, Rico e Valdir Vargas.



ABAIXO:
ESBOÇO EM POWER POINT DO CAPÍTULO 4, QUE AINDA SERÁ LAPIDADO POR FERNANDO MESQUITA (responsável pelo projeto gráfico do livro)

 DUPLA 1


 DUPLA 2


 DUPLA 3


 DUPLA 4



segunda-feira, 2 de setembro de 2013

CAPÍTULO 3

Uma prévia do terceiro capítulo do livro: 
"A Grande História do Surf Brasileiro"

Com base nas pesquisas realizadas até agosto de 2013, apresento aqui um esboço do texto proposto para o terceiro capítulo do livro, que trata dos primórdios do surf na cidade do Rio de Janeiro. Ao lançar estes primeiros capítulos "abertos" na internet, o objetivo maior é fazer com que a comunidade do surf interaja trazendo informações que enriqueçam este conteúdo e o projeto como um todo. A responsabilidade maior será no momento de imprimir, definitivamente, os mais de 50 capítulos do livro. Aí estaremos falando de 3, 5, talvez 7 mil exemplares, de um "documento" que ficará para nossas futuras gerações.
O convite para as críticas construtivas fica aberto aqui.

Vejam detalhes do projeto no SITE:  www.hsurfbr.com.br
          
Capítulo 3 - (vinheta) MEMÓRIAS  
(by Tom Veiga)


RIO ANOS 50 - "Inventores"

Berço do Surf Brasileiro

Descobrindo a aventura de cavalgar com pranchas as ondas em uma cidade maravilhosa.

Toda atividade nova surge pela ousadia de alguns poucos visionários. O estopim para que as primeiras pranchas fossem construídas na cidade do Rio de Janeiro foi a observação curiosa de tripulantes de aviões, ou marujos norte-americanos, que trouxeram as primeiras tábuas, ainda nos anos 40, ocasião em que o Porto do Rio de Janeiro era uma das bases aliadas durante a II Grande Guerra. A prancha foi embora, junto com seu dono no navio. Mas a brincadeira não passou sem ser notada. O clima convidativo das praias do Rio era algo entre a temperada Califórnia e o tropical Havaí.
O surf se instalou aqui!


Essa prancha que veio ao Brasil provavelmente havia sido fabricada com a madeira mais utilizada na época a “redwood”, da família das sequoias da Califórnia. Os precursores apontam Paulo Preguiça (DESCOBRIR NOME REAL) como o indivíduo que, ainda nos anos 40, tentou (pelo o que havia memorizado) construir uma prancha com madeira brasileira. Ele começou a surfar em Copacabana, isoladamente.
Um segundo personagem fundamental é o engenheiro Luís Carlos Vital, conhecido como Bisão. Ele e o amigo George Grande fizeram uma prancha enorme, oca no estilo daqueles modelos de Tom Blake (ver CAPÍTULO 1 postado abaixo). Os dois iam juntos na prancha com Luís Bisão, mais pesado, atrás. A princípio iam deitados, mas logo na primeira onda que eles conseguiram ficar de pé, a prancha se espatifou. Bisão construiu um outro modelo de tábua, menor e maciça, parecida com uma prancha que já era utilizada para correr as ondas deitado (bodyboard), esta já com o bico envergado. Vital aperfeiçoou seu design e fez meia dúzia de pranchas iguais para os amigos. Foram as chamadas “Porta de Igreja”. A turma era pequena, seis felizardos eram os donos das pranchas novas, que eram divididas irmãmente, com as devidas prioridades, para os agregados.

ARDUÍNO COLASSANTI SEGURANDO UMA PRANCHA DO MODELO
"PORTA DE IGREJA" EM UMA DAS RARAS IMAGENS DESTE ARTEFATO. 
FOTO: ARQUIVO PESSOAL IRENCYR BELTRÃO (autor do clic: desconhecido)

A esta altura, início dos anos 50, o pessoal já tinha eleito o Arpoador como o ponto de encontro da turma dos pranchistas. Para lidar com aquelas ondas que vinham lá de fora, era necessário ter intimidade com o mar. Estes precursores foram, na sua maioria, praticantes de pesca submarina, mergulhavam com arpões, entendiam as correntes, como ela se comportava ao lado das pedras. Bruno Hermany, que chegou a vencer dois mundiais de pesca submarina, George Grande, que surfava mais de peito, gostava do bodysurfing, Jorge Americano – Jorge Paulo Lemann, que depois se dedicou ao tênis, sendo um dos poucos brasileiros que teve a honra de pisar na grama de Wimbledon, Gilberto Laport, Arduíno Colassanti e um pouco depois Irencyr Beltrão são alguns dos mais conhecidos desta turma pioneira.
Com estas pranchas eles faziam uma linha reta diagonal e o objetivo era chegar o mais longe possível. Elas eram basicamente retangulares e já tinham uma quilha, bem baixa, com cinco centímetros de altura e compridas, corriam por um terço da prancha. As melhores ondas eram surfadas das pedras lá fora até a linha da Francisco Otaviano, por quase 300 metros. Os destaques em termos de habilidade eram Jorge Americano, Gilberto Laport, Paulinho “Macumba” Bebiano e Arduíno, que venceu a primeira competição, que era para ser de pesca, mas como o mar estava turvo, batendo nas pedras, decidiram mudar para surf. As meninas que estavam na praia decidiriam o vencedor. Com a ausência do favorito, Jorge Paulo, Arduíno foi aclamado.


MADEIRITES – O AVANÇO
O surf começou a tomar forma, como uma cultura de praia, nos anos 50, quando este grupo de mergulhadores, praticantes de pesca submarina, homens do mar, que frequentavam as pedras do Arpoador, enxergaram o potencial de diversão daquelas ondas. Eles podem ser considerados a primeira geração de surfistas do Rio de Janeiro. O surf não pararia mais no Brasil.

INÍCIO DOS ANOS 60. PRANCHAS DE MADEIRITE
NO POSTO DE SALVA-VIDAS DO ARPOADOR.
FOTO POSTADA POR MARCELO KANECA EM SEU BLOG - LENDAS DO RIO

A criatividade do brasileiro é notória, este pessoal da pesca usava aquelas lanchas voadeiras, produzidas em compensado naval. Irencyr Beltrão conheceu o construtor de barcos Moacir, em uma serraria na Ilha do Governador. Irencyr foi lá para ver o barco de uma amigo do Clube Marimbás, um clube de pesca localizado entre Copacabana e o Arpoador e surgiu a ideia de utilizar este expert carpinteiro para sofisticar os modelos das pranchas. Lá foram construídas as primeiras pranchas de madeirite, em 1959. A primeira leva foi de três pranchas confeccionadas em folhas de compensado naval, já tinham um shape com o bico e a rabeta arredondados, envergadura e as quilhas, agora com curvas (foil), foram evoluindo também. O “segredo”, da localização da fábrica na Ilha do Governador, era guardado a sete chaves pelos pioneiros, já com receio que o crowd invadisse o Arpoador. Isso não poderia durar...
Na rua Francisco Otaviano, no coração da Zona Sul, também havia uma marcenaria, que começou a produzir madeirites, não com a mesma qualidade do seu Moacir, mas que satisfaziam o número crescente de surfistas. A Serraria Arpoador chegou a fazer uma boa produção destas pranchas. O modelo chegou a ficar tão popular que foi copiado e até lojas de produtos esportivos, como a Procópio Sports, introduziram modelos em série destas pranchas ao lado de raquetes de tênis e bolas diversas. O surf começava a se popularizar em meados dos anos 60.
Com as pranchas de madeirite a performance começou a tomar mais importância, além do controle da prancha, já se desenhavam as primeiras manobras, mudanças de direção, sobe e desce, a preocupação de colocar a prancha no ponto mais crítico na onda. A princípio os surfistas usavam pés de pato, pois estas madeirites não tinham flutuação como as pranchas de hoje. Ao colocarem o corpo sobre elas, afundavam, para entrar mais fácil nas ondas a solução era o uso de pés de pato. Porém estes atrapalhavam para subir na prancha, mas não se cortassem as pontas deles.

CAPA DO LIVRO DE TITO ROSEMBERG
PUBLICADO PELA EDITORA GAIA EM 2012
QUATRO SURFISTAS DIVIDINDO UM MESMA ONDA EM SUAS MADEIRITES, 1963.

O fenômeno das madeirites é uma típica invenção 100% brasileira. Essa geração inicial de surfistas estava “inventando a roda”, tudo era novo para eles e a busca pela melhor saída era a criatividade dos envolvidos, muita coisa era feita na base da experimentação. Isso não deteve o crescimento do surf no Brasil. Uma segunda geração foi se formando. Esta viveu a primeira grande transformação, que seria a evolução das pranchas de madeira para as de espuma leve, encapadas com fibra de vidro. Detalhes desta fase serão apresentados no próximo capítulo das MEMÓRIAS DO SURF BRASILEIRO. Uma forma de aquilatar esta popularização é a música “Vamos Pranchar”, que saiu no LP – Braziliance! De Marcos Valle. Os irmãos Marcos e Paulo Sergio Valle também haviam aderido à onda do surf no início dos anos 60.


O RIO E O RIO DOS PRANCHISTAS
Vivendo neste mundo moderno de hoje é interessante darmos uma situada no que era o Rio de Janeiro daqueles tempos. A região de Copacabana e Ipanema tinha água clara, sem poluição. O Arpoador era diferente do resto do Rio, muitos dos frequentadores eram os esportistas, descolados, artistas, os estrangeiros também gostavam de ir para lá. O astral daquelas pedras do Arpoador era mágico. Uma das atividades mais empolgantes era a pesca submarina, chegaram a ser capturados meros com 100kg perto do pontão. O pessoal saltava das pedras. Encontrava diversão num ambiente que era mais selvagem do que urbano, destaco o trecho de uma longa entrevistas que fiz com Otavio Pacheco, para enriquecer diversos trechos do livro: “Nos anos 40 meus pais começaram a frequentar o Arpoador, na época a cidade do Rio de Janeiro era concentrada do Bairro do Flamengo para o centro e as pessoas, nos finais de semana iam até Copacabana e os mais aventureiros seguiam em direção ao Arpoador e Ipanema, que era um areal, uma restinga ainda. Foi nessa época que começou a cultura de praia, eles foram pioneiros no frescobol, vôlei de praia, caça submarina...”

Até 1959 o Rio de Janeiro era a Capital Nacional, a principal porta de entrada do Brasil para quem vinha do resto do mundo, o Rio era o caldeirão de ebulição da ideias mais criativas, das tendências mais modernas que aportavam na América do Sul. A praia de Copacabana era um dos símbolos do Rio, com seu Palace Hotel, que havia sido inaugurado nos anos 20. Em 1955 o novo presidente eleito pelo povo, Juscelino Kubitschek havia assumido de forma empolgada querendo acelerar o Brasil, progredir “50 anos em 5”, esse era o lema. O país todo vivia momentos de euforia, a vida na praia começava a ser descoberta com maior ênfase na diversão e o surf era praticado basicamente por jovens, adolescentes que em sua maioria eram os novos adeptos. Isso tinha a cara do Rio.

BADUÉ SALTANDO DAS PEDRAS DO ARPOADOR COM SUA 
PRANCHA DE MADEIRITE
FOTO DE 1964 EXTRAÍDA DO ACERVO DE ARMANDO SERRA

Muitos praticantes aderiram ainda na era das madeirites: Múcio Palma, Badué, Charuto, Armando Serra, René Simas, as meninas Fernanda Guerra e Maria Helena, João Cristovão, Pauleti Ribeiro, Fabio Kerr, o talentoso Jorge Bally, irmãos como Betinho e Paulinho Lustosa, Marcelo e Walcir Rabello, Alexandre e Antonio Bastos, Mário Bração e Piuí Brant. Mário inclusive foi um dos primeiros surfistas que decidiu montar uma fábrica de pranchas, ainda no tempo das madeirites.
Também foram principiantes de madeirite que se transformaram em shapers, Cyro Beltrão (irmão mais novo de Irencyr), Penho, Tito Rosemberg, e os jovens Carlos Mudinho, Rico de Souza e Otavio Pacheco.
Estes surfistas começaram suas aventuras de pé sobre as ondas ainda na era das pranchas de madeirite, mas teriam uma influência ainda maior na nova fase do surf brasileiro, que começaria após a vinda de um certo australiano (Peter Troy), que mostraria uma nova abordagem. O novo caminho.


ESSA HISTÓRIA SERÁ CONHECIDA NOS PRÓXIMOS CAPÍTULOS...

A segunda metade dos anos 60 foi uma das épocas mais palpitantes não só para o surf do Rio de Janeiro, mas para todo o desenvolvimento do surf que passaria por uma grande evolução, o Capítulo 5 será lançado na internet até o final do mês de outubro. Acompanhem...

ESTE PROJETO ESTÁ ABERTO PARA TODAS AS COLABORAÇÕES QUE SERÃO ARQUIVADAS E ORGANIZADAS ATÉ O LANÇAMENTO DO LIVRO IMPRESSO EM 2017.

Bibliografia e Pesquisa utilizada para este capítulo:

SURFE – DESLIZANDO SOBRE AS ONDAS (1980), Carlos K. Lorch – Editora Guanabra Dois
A HISTÓRIA DO SURF NO BRASIL – 50 ANOS DE AVENTURA (1989), Alex Gutenberg – Editora Azul
ARPOADOR SURF CLUB (2012), Tito Rosemberg – Editora Gaia
Matérias das revistas BRASIL SURF, TRIP, FLUIR, HARDCORE, SOUL SURF e TSJ BRASIL.
Artigos da internet dos sites Waves, ASP South America, 360 Graus, VW e www.revistadehistoria.com.br.
Blogs: Lendas do Surf de Marcelo Kaneca, Blog do Rico
Depoimentos escritos, colhidos por Wady Mansur de Arduíno Colassanti e Irencyr Beltrão e ainda E-mails enviados por Armando Serra.

Entrevistas gravadas com Tito Rosemberg, Rico de Souza e Otavio Pacheco.